Entre as fotos de Pier Giorgio Frassati, talvez as mais bonitas sejam aquelas que o retratam enquanto subia pelos picos, arrastando atrás de si, com seus músculos de aço, uma penca de amigos. Não só pelos Alpes ele arrastou os amigos, mas também pelos picos bem mais inóspitos da santidade.
Desde os dias de seu desaparecimento até hoje, Pier Giorgio tem um séqüito de almas que superaram seus próprios limites, que subiram “para o Alto”, olhando para Ele que os precedia. Eis algumas dessas almas.
Em 1928, apenas três anos após sua morte, saiu a biografia escrita por seu professor, D. Antonio Cojazzi, salesiano. Em Triuggio, perto do lago de Como, um jovem de 18 anos estava fazendo os exercícios espirituais e tinha apenas lido a recém impressa biografia de Pier Giorgio. O jovem se chama Giuseppe Lazzati e está para se inscrever na Universidade Católica do SS. Coração. Anota em seu diário: “ Senti, partindo de Pier Giorgio, um fascínio que me atraia, porque ele, nas terríveis lutas próprias de todos os jovens, manteve firmes os princípios da fé, longe de qualquer coisa que fosse passageira, para manter apenas o que pode saciar nosso coração.” Mais adiante, enquanto afirma que” está fazendo os exercícios com Pier Giorgio”, escreve: “Pela parte que me toca decidi: quero me empenhar com todas as forças quero dar tudo que possuo… Olharei para Pier Giorgio, procurarei amigos com quem consiga mais facilmente vivenciar o bem”.
Estudante universitário, Giuseppe Lazzati continuou olhando Pier Giorgio como modelo. Professor de literatura cristã antiga na Universidade Católica, indicava Pier Giorgio como modelo de vida aos seus alunos. Inspirou-se também nele quando fundou seu Instituto secular de leigos consagrados no mundo, para construir o Reino de Cristo. Pier Giorgio sempre lhe pareceu ser um exemplar do “miles Christi ”, como deve ser o leigo cristão na sociedade.
E mirando-se em Pier Giorgio, vivendo como ele, Giuseppe Lazzati tornou-se, em tempos difíceis, Reitor Magnífico da Universidade Católica. Foi em tal investidura que escreveu ao Papa Paulo VI para que fosse desbloqueada a “causa” de Pier Giorgio: “Ouso pedir à Sua Santidade que queira ainda mais uma vez solicitar a conclusão do já iniciado processo romano para a beatificação de Pier Giorgio.” Era 10 de maio de 1975. Paulo VI decidiu prosseguir: foi o passo decisivo que levou à conclusão sobre a beatificação de Pier Giorgio em 20 de maio de 1990.
Todos sabem que Giuseppe Lazzati, leigo consagrado, homem de altíssima cultura, educador de gerações de jovens, faleceu em 19 de maio de 1986, em estado de santidade: humilde, pobre, límpido e forte como Jesus. Num dia luminoso de 1977 disse a este que escreve: “ Você trabalha na escola. Estuda, ama, prega, trabalha. Educa os jovens à altura de Cristo.” Certamente dizendo isso ele pensava no inesquecível Pier Giorgio Frassati.Encontra-se em curso seu processo de beatificação.
“Serei dominicano como Pier Giorgio”
O salesiano D. Adolfo L´Arco, fez a curadoria, há alguns anos, de um livreto intitulado “Um jovem que tem o Paraíso nos olhos”. (Marchionne, Chieti, 1984). É a história de Dino Zambra, nascido de uma nobre família em Chieti, em 1922; depois da escola secundária inscreveu-se na Faculdade de Letras da Universidade Católica de Milão; em 1943 foi chamado pelo exército; em 3 de janeiro morreu aos 22 anos no hospital de Lecce.
A vida desse jovem intelectual é toda marcada por um caminho continuo em direção à santidade, toda cheia de oração, estudo, sensibilidade para com os problemas sociais, políticos, culturais, uma vontade formidável de fazer o bem, de levar Cristo aos irmãos. Seu modelo de vida é Pier Giorgio Frassati, que cita bem umas dez vezes. Eis alguns testemunhos extraídos de seu diário:
“Esta manhã, indo ter com os pobres, vi muitos casos de miséria (…) Decidi: de agora em diante terei apenas o que necessito para viver com certo decoro, o restante darei aos pobres, venderei os bens de minha família e darei o que obtiver com isso aos pobres. Para mim basta meu trabalho. Pier Giorgio queria fazer assim”. (26/4/1941).” Notei que na minha escalada eu sinto prazer com a admiração humana. Já Pier Giorgio se preocupava em agradar apenas a Deus.” (30/6/1941) . ”Pier Giorgio se confessava com qualquer sacerdote, já eu preciso de um guia espiritual.” (2/7/1941).
O dia 4 de julho de 1941 é o 16º aniversário da morte de Pier Giorgio. Dino Zambra escreve: “Hoje rezei mais intensamente. Reli o capitulo de sua morte e me propus a jamais fazer alguma coisa que ele não fizesse.” Alguns dias depois: “Compreender os pensamentos, as necessidades, as aspirações dos outros povos. Isso queria Pier Giorgio, para isso nós os católicos deveríamos tender.”
Como todos os jovens estava em busca do próprio caminho. Atraia-o o casamento e Marisa, a jovem pela qual sentia simpatia, parecia para ele que se tornaria sua companheira. Mas logo compreendeu que Deus o chamava para a vida religiosa. Escreveu a ela para dizê-lo, depois anotou no diário: ”Entre os Dominicanos entraria com prazer, por S. Tomás, por Pier Giorgio (era terciário dominicano com o nome austero e santo do Savonarola) e também porque, preferindo colocar a serviço de Deus os talentos que me deu, preferiria uma ordem estudiosa.”
Antes que a meningite o abatesse definitivamente aos 22 anos, fez seu testamento: dividiu as 660 liras que possuía, destinando 600 a uma família necessitada de Chieti, 50 para uma Missa em seu sufrágio e 10 à sua mãe, como recordação. Como Pier Giorgio, morria pensando em seus pobres.
O engenheiro ao encontro de Cristo
“Alberto Marvelli” – disse João Paulo II em Rimini a 19 de agosto de 1982 – representa para todos um modelo e um chamado.” Nasceu em 1918 de família privilegiada; humilde e forte; empenhou-se na fé, na pureza, nos estudos e no trabalho de engenheiro, dedicou-se ao apostolado nos campos da caridade, administrativo e político.
Viveu em Rimini, sofrendo e trabalhando no período da guerra para salvar dramas e tragédias sem fim, tornando-se esperança e socorro para todos os desesperados. Foi dirigente da Ação Católica, presidente dos Laureados, membro da Sociedade Operária. Também para ele Pier Giorgio foi modelo de vida. Tiramos de seu diário espiritual:
“Devo progredir, continuamente, degrau por degrau, dia por dia, sempre aspirando pelo vértice máximo, Deus. Eu preciso,, eu quero.” (21 de março de 1939, seu 21º aniversário).
“ É inútil querermos nos fazer santos se não meditamos, se se corre atrás de cada pensamento frívolo, se não somos capazes de nos impormos um recolhimento vivo.” (23/8/1946).
Algum tempo antes tinha escrito:
“Amanhã completo 18 anos e proponho ser melhor em tudo. Me esforçarei em imitar Pier Giorgio Frassati. (março 1936). “ Estou relendo a vida de Pier Giorgio Frassati que já me fez tanto bem (era a biografia por D. Cojazzi) Oh, pudesse imitá-lo! Em sua pureza, bondade, caridade, piedade. É bem verdade o que disseram: a Terra não era digna dele. Ele imitou e seguiu Cristo muito bem“.
Somente Deus conhece o bem feito por esse jovem em seus breves 28 anos de vida, arriscando freqüentemente a pele por amor a Cristo e a seus irmãos necessitados. Um acidente, em 5 de outubro de 1946, interrompeu a vida de Alberto Marvelli, quando um caminhão desgovernado o atingiu enquanto, de bicicleta, dirigia-se a uma reunião onde se comprometeria, como sempre, em construir uma Itália mais justa para o homem, calcada sobre o Evangelho de Cristo. “ A Coroa do Rosário – escreveu sobre ele P. Ugo Rocco, S.J. – juntamente com o Ofício a Nossa Senhora que tinha no bolso além da Bíblia e do volume do Getsemani, encontrados junto a sua cama, são a herança e ‘o chamado’ que Alberto grita também para nós”. Na luz de Pier Giorgio, Alberto Marvelli foi beatificado por João Paulo II em 05 de setembro de 2004.
O professor torna-se Pe. Mariano
Chama-se Paolo Roasenda e nasceu em Turim em 1906. Nos anos de secundário e Faculdade conheceu Pier Giorgio Frassati e entusiasmou-se por ele em vida e mais ainda depois de sua morte. Tornou-se modelo vivente por seu exemplo. Formou-se em Letras, apaixonado pelas letras clássicas que ensinou com amor e competência durante diversos anos em alguns liceus da Itália, levando às escolas o Evangelho de Cristo que, sozinho, ilumina a cultura e dá sentido à vida.
Em 1940 o brilhante professor de latim e grego entrou na Ordem dos Capuchinhos, tornando-se Padre Mariano de Turim. Continuou a inspirar-se em Pier Giorgio e a falar freqüentemente dele como de uma luz que houvesse re-iluminado sua vida no mundo e que agora re-iluminava sua vida religiosa, também quando foi chamado para ser o responsável por uma popular chamada na TV, seguida por milhões de telespectadores. Alguns “fragmentos” de seu amor por Pier Giorgio.
Era comum relembrar “a comoção de toda Turim no dia tristissimo e estranhamente sereno de seus funerais”. Prosseguia acrescentando: “ Me perguntei muitas vezes por que este jovem que a morte arrebatou aos 24 anos, estandarte vivo de juventude cristã no mundo, é sempre relembrado e amado. Daqueles três dons terríveis que são a beleza, a juventude e a riqueza, quis fazer ótimo uso; amou o belo e o bom sempre; foi por isso amado por todos. Ele transformou através de suas diversas biografias milhares de existências de jovens e de homens, os quais, diante do fato consumado, sentem cair cada objeção, especialmente aquela mais tola que circula pelos salões, nos filmes, nos romances e no fundo do coração de cada um de nós: é possível ser puro?
”Como fez Pier Giorgio?” Pe. Mariano esclarece: “Com a força de sua vontade ajudada pela Graça de Deus… Encontrou linfa vital ao seu agir viril na Comunhão quotidiana, no Rosário que nunca deixava, em suas visitas aos pobres.”
P. Mariano apagou-se na primavera de 1972, após 17 anos de serviço na TV, fecundíssimo de bens, de conversões, de renovações de vida para muitos, após 32 anos de vida religiosa heróica, aos 66 anos de uma existência sempre generosa e grande. No início de seu caminho, se perfilou Pier Giorgio Frassati. Hoje já foi introduzida a causa de beatificação de pe. Mariano.
São alguns exemplos, os mais significativos, mas podemos citar outros. Se recolhêssemos as histórias de “santos”, amadurecidos no exemplo de Pier Giorgio, certamente resultaria um livro muito grosso, e mais, seria incompleto. O envolvimento de Pier Giorgio com os “picos” de Deus começou em sua juventude ardente e não termina nunca. Nesse envolvimento está também um jovem da Cracóvia, Karol Wojtyla, hoje João Paulo II. E também este escritor, que bem longe de ser santo, sabe caminhar com uma mão na mão forte de Pier Giorgio.
* professor,escritor,leigo consagrado na família domenicana.